Queria que recolhesse ao seu cantinho dentro do peito, de onde não deveria
ter-se soltado. Queria poder voltar a trás e nunca ter permitido que se
expressasse, que nunca mostrasse a sua existência, mesmo que tivessem sido só
percebidos laivos, sombras, pequenas insinuações de presença. Foi-se soltando
de mansinho, em silenciosos passinhos que só consegui travar quando, pela minha
inércia, começaram a ecoar. Não podendo retroceder no tempo, queria poder
retroceder o trajeto que percorreu e deixa-lo descansado e tranquilo no pequeno
lugar onde o confinei durante sempre. Convivemos, vivemos e sobrevivemos os
dois, assim, por anos... Eu e este apontamento, esta pequena grande panóplia de
sensações, ao qual nunca me atrevi de reconhecer como sentimento.
Mas as gotinhas que escaparam e derramaram, ganharam vontade de ser mar, e
na imensidão em que se acreditam, reduzi-las e tranca-las revela-se numa tarefa
que exige muito mais além da coragem, da força e da vontade. Exige algo que não
sei o que é, não sei como cumprir.
A verdade é que esta inquietude que sempre me habitou, mas que dominava e
domava, sempre se quis fazer entender como um desígnio, como um sinal, como uma
peça solta de um puzzle final. Eu... sempre a quis ver como um pequeno delírio,
um escape mental que visitava algumas vezes. Podia, assim, entrar numa outra
dimensão, à minha medida quase, e viver uma vida paralela, só por fechar os
olhos... Mas quando os abria, a portinha do cantinho fechava-se, tudo ficava em
silencio e tranquilo até à próxima visita.
a festa dos 52...
Há 2 meses